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Gifting & Compliance

Foto: soo hee kim | shutterstock.com
Como adequar a prática de gifting às normas de compliance

Nos últimos anos, a legislação brasileira vem passando por mudanças referentes ao combate à corrupção. Isso afeta todos os setores do mercado e pede uma readequação das empresas quanto a suas regras e instruções internas. Dessa forma, as organizações estão buscando cada vez mais recursos sobre a implementação de um plano de compliance. O termo em inglês é utilizado para denominar um conjunto de disciplinas para se fazer cumprir as regras normais e regulamentadas. E é através desse plano que as empresas conseguem evitar, detectar e tratar qualquer desvio ou inconformidade. O assunto está na pauta de diversas companhias, independente do porte, e deve se propagar pelo país

Rodrigo Bertoccelli, Presidente do IBDEE

De acordo com Rodrigo Bertoccelli, Presidente do IBDEE (Instituto Brasileiro de Direito e Ética Empresarial), o ano de 2017 foi positivo para a sistematização do compliance no Brasil. “Testemunhamos importantes decisões judiciais e debates entre especialistas e autoridades em torno do tema. Com a edição de leis estaduais obrigando empresas que contratarão com o poder público a terem um programa de compliance, a exemplo da Lei Fluminense nº 7753/17; a edição da norma ISO 37001 que trata de sistemas de gestão antissuborno, certificável às empresas; bem como uma maior consciência das empresas a respeitos dos riscos relacionados ao ‘não-compliance’”. Para Bertoccelli, embora ainda falte muito ao Brasil em termos de transparência e integridade, suas perspectivas são otimistas em termos do amadurecimento do compliance e a eficiência no combate à corrupção em 2018.

Afinal, o que é gifting?

“Gifting é o estudo que estrutura as políticas de troca em todas as plataformas de comunicação corporativa definindo parâmetros de valor, métricas de circulação e rituais proprietários. Cada pequena troca (objetos, experiências, acessos, conteúdo) é planejada, compreendendo a cultura de uma corporação como se fosse a de uma nação — um processo repleto de simbologias, capaz de contar a história de uma empresa ou de uma personalidade, fazer transparecer o seu código de marca e tornar tangíveis suas crenças para além dos produtos e serviços que comercializa e promove”, explica Marina Pechlivanis, especialista no tema e Sócia-Fundadora da Umbigo do Mundo, agência de comunicação estratégica criada em 1999.

Marina Pechlivanis, Sócia-fundadora da Umbigo do Mundo

Assim como qualquer estratégia de escambo ou negociação, o gifting deve ser bem pensado e planejado. Independendo do investimento disponível, a mensagem, contexto, público e hora certa determinam o sucesso da aplicação do método. O processo envolve ainda o mapeamento da história da empresa, seus valores, objetivos, o público com quem se relacionam e a mensagem que quer passar para o mercado, por exemplo, além da política de preços – ligada diretamente ao compliance.

Especialista no tema, Marina conta que o “dar-receber-retribuir” é um ritual que se repete na humanidade há milênios. Os objetos e experiências trocados podem sofrer alterações de acordo com a cultura, mas a estratégia de saber presentear para ser lembrado permanece. “Todas estas trocas — por questões políticas, afetivas, econômicas, estratégicas, por educação ou mesmo por oportunidade — podem gerar tensão entre expectativas e intenções, entre interesseiros e interessados, deixando tênue a linha que separa o que é espontâneo e o que é obrigatório sempre que alguém oferece algo a outra pessoa. Estudiosos das relações sociais chamam de ‘valor de vínculo’ o sistema que afere valor a objetos, serviços, gestos ou qualquer outra representação no universo dos relacionamentos, considerando o quanto efetivamente contribuem para o fortalecimento destes laços. Se é muito usada? Diariamente, por todos os setores de todas as empresas. É só você prestar atenção. Se está sendo bem implementada? Isso já é outra questão”, diz.

Presente x Propina

Segundo o dicionário Aurélio, um dos significados da palavra propina é gorjeta, gratificação. E é nesse quesito que as organizações devem tomar cuidado para que o gifting não transpasse a barreira entre o ato de divulgar a empresa e o que pode ser considerado corrupção. Aqui, o compliance ajuda a identificar o que não é aceitável para cada ambiente e situação. “Percebe-se que o tema do gifting costumava ser tratado de forma exclusiva pelas áreas de comunicação e marketing das empresas. Naquele momento, em que assuntos relacionados à compliance ainda eram pouco difundidos, não se visualizava com maior clareza os riscos inerentes a troca de brindes, especialmente quando se tem um cliente público do outro lado. Assim, com a evolução do compliance, seus respectivos programas passaram a regular o tema do gifting com maior cautela, trazendo orientações diversas acerca deste tema, tais como, que se observe o Código de Ética do cliente para verificar se há vedação ou limites para que seus colaboradores possam receber brindes dos seus fornecedores”, explica Valois.

Rubens Lorenzetti, CEO da Fantastic Brindes

Nesse cenário, quem fornece os gifts para as empresas também percebeu um impacto causado pelo sistema de compliance. “Vender hoje para clientes preocupados com compliance exige o preenchimento prévio de formulários onde devemos demonstrar que cumprimos com regras trabalhistas, ambientais, fiscais, etc. Fornecedores de empresas preocupadas com sua imagem não permitem estar associadas com quem desrespeita regras básicas. Cite-se, como exemplo, grandes fabricantes de vestuário que terceirizaram sua produção e foram acusados de coniventes com o trabalho escravo”, explica Rubens Lorenzetti, diretor da Fantastic Brindes, empresa de fabricação própria de diversos produtos promocionais personalizados.

Diego Valois, Diretor Jurídico do IBDEE

O importante é que as trocas sejam objetivas e equilibradas, mesmo com a subjetividade que norteia a dimensão do gifting, uma vez que cada empresa tem sua política de preços estabelecidas pelo compliance. Além do valor em moeda, precisamos pensar também na percepção que o outro tem sobre o que recebeu e possíveis valores voláteis, ligados diretamente ao processo interpretativo. “O Gifting, se bem dosado e bem pensado, sempre pode ser uma boa estratégia em qualquer relação de troca ou negociação. Você não precisa investir milhões para encantar alguém, precisa saber tangibilizar a mensagem certa, na hora certa, no contexto adequado, para o público correto. Errou na dosagem e não pensou direito? Cuidado: a história está repleta de guerras que começaram assim”, alerta Marina, que é Mestra em Comunicação e Práticas de Consumo pela ESPM.

E agora, o que é permitido?

Isso é algo que depende diretamente das regras de cada empresa. No caso de quem aplica o compliance, é preciso verificar as normas e se adequar a elas. “O ponto principal é saber qual é a diferença entre o brinde e o presente. O brinde, segundo o entendimento, é aquele produto que não tem valor comercial e que, de alguma forma, faça referência à marca da empresa. Então ele tem realmente o cunho promocional”, explica Alessandra Gonsales, sócia do WFaria Advogados e da LEC (Legal Ethics Compliance).

Alessandra Gonsales, Sócia do WFaria Advogados e da LEC (Legal Ethics Compliance)

O processo de implementação do compliance exige o envolvimento da alta gestão da empresa, bem como a criação de uma área específica e com autonomia funcional – respondendo diretamente ao CEO ou Conselho Administrativo. Além disso, não basta apenas a aplicação da política, é preciso capacitar e realizar treinamentos contínuos com todos os colaboradores da organização (independentemente da posição) sobre o programa de compliance, incluindo ainda o monitoramento sobre as práticas perante as normas estabelecidas.

Para Diego Bertoccelli, o Brasil ainda tem muito a aprender com outros países. “Nos Estados Unidos, por exemplo, a principal referência legal é o Foreign Corrupt Practices Act (FCPA), lei federal editada em 1977, portanto já há uma coleção de experiências e uma inteligência de mais de 40 décadas no assunto”, diz.

Políticas na prática

Muitas organizações já aplicam as políticas de compliance em suas diretrizes. No caso da Unisys – empresa mundial de serviços e soluções de Tecnologia da Informação com mais 100 anos de existência, essa preocupação sempre esteve presente. A empresa dispõe de um sólido programa de compliance que permite que seus colaboradores trabalharem em conformidade, mantendo um ambiente de confiança, protegendo a reputação da empresa e tornando os projetos mais eficazes, a fim de alcançar resultados mais positivos. “Trabalhamos com um programa de compliance alinhado ao de nossa corporação, pelo qual sou responsável na América Latina. Organizamos e oferecemos diretrizes para todos os processos e condutas a fim de cumprir todas as normas legais, regulamentos, políticas e diretrizes estabelecidas para os negócios da companhia do ponto de vista local, regional e global. Temos uma política que orienta os limites aceitáveis para oferecimento de cortesia de negócios tanto no setor público quanto no setor privado, em todos os países da America Latina, respeitando o nosso padrão ético e a legislação local”, conta Claudia Gomes, Diretora Jurídica da Unisys para América Latina.

Claudia Gomes, Diretora Jurídica da Unysis para América Latina

A empresa procura se manter atualizada sobre os processos internos de compliance, o que inclui o código de ética e treinamentos on-line e presenciais. Consequentemente, há uma preocupação com a transparência e credibilidade para informar seus colaboradores quanto aos processos e ferramentas disponíveis. Para isso, duas ferramentas facilitam o canal de comunicação. Através do Unisys compliance helpline, o colaborador pode informar situações de forma identificada ou anônima, tirar dúvidas e denunciar algo, por exemplo. Já o Unisys conflict of interest tool permite o registro da existência de um relacionamento pessoal com alguém ou alguma empresa, assim como práticas comerciais inadequadas, que possam interferir na prestação de serviços ou nos negócios com determinada companhia.

“Também realizamos treinamentos de ética anuais, on-line e presenciais, com certificações para nossos colaboradores, com espaço aberto para o tratamento dos assuntos que nos são trazidos. As investigações internas são conduzidas de forma confidencial e por uma equipe especializada. Estar em conformidade com a legislação é um parâmetro fundamental para as operações da Unisys, em nível global”, afirma Claudia.

Segundo a Diretora Jurídica, o investimento em compliance não traz retorno financeiro direto, mas possibilita uma melhor governança empresarial, organização, e maior segurança para que os processos sejam mais eficazes. Assim, as estratégias se tornam mais assertivas e rentáveis.

O impacto nos eventos

Para o setor de eventos, o gifting é uma prática muito utilizada – e não apenas sobre os brindes comumente distribuídos. Isso porque o evento em si pode ser considerado um gift, através das experiências, sensações e vivências que são oferecidas, gerando memórias para quem participa.

Em encontros de diversos públicos e nichos específicos, cada detalhe deve ser planejado para surpreender e tridimensionalizar a essência de quem está presente com uma marca, produto, ou serviço, entre outros casos. “Na Umbigo do Mundo  agência temos um took kit chamado o Sistema das Relações de Troca e a ferramenta ‘Gifting&Rituals Map’, que são espetaculares para mapear e mensurar cada uma das iniciativas em gifting para eventos, ajudando tanto na organização como na prestação de contas para os clientes no antes, durante, e pós evento”, conta Marina Pechlivanis.

Em encontros de diversos públicos e nichos específicos, cada detalhe deve ser planejado para surpreender e tridimensionalizar a essência de quem está presente com uma marca, produto, ou serviço, entre outros casos. “Na Umbigo do Mundo  agência temos um took kit chamado o Sistema das Relações de Troca e a ferramenta ‘Gifting&Rituals Map’, que são espetaculares para mapear e mensurar cada uma das iniciativas em gifting para eventos, ajudando tanto na organização como na prestação de contas para os clientes no antes, durante, e pós evento”, conta Marina Pechlivanis.

Nesse quesito, a Diretora Jurídica da Unisys conta que os eventos da área de marketing, bem como os incentivos culturais, são realizados com estrita observância das normas, regulamentações e leis locais. Segundo ela, há políticas específicas, com diretrizes definidas para eventos de negócios.

“A empresa dispõe de um programa de compliance, por meio do qual disponibilizamos políticas e procedimentos para todos os processos e condutas, englobando desde as operações de vendas, controles internos e áreas de suporte, até o departamento de marketing, responsável pela produção de eventos na Unisys. Com envolvimento e suporte integral da alta administração da companhia, o programa tem o papel de formalizar processos e implementar ações de conformidade em toda a empresa”, afirma Claudia. Devemos lembrar que os brindes não têm valor relevante e são abertos a todos, sem discriminação na entrega dos mesmos. Já o presente tem cunho comercial e não necessariamente está relacionado à divulgação ou promoção – podendo ter interpretações diversas, o que inclui também a troca de algo ilícito. Assim, é imprescindível uma ação conjunta com a área jurídica, que pode fornecer orientação quanto ao compliance, e até mesmo procurar o auxílio de um profissional especialista em gifting.

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